Um dos maiores obstáculos enfrentados pelo Poder Judiciário brasileiro, no que tange à execução, é a falta de efetividade na persecução do crédito e satisfação do credor, tornando a inadimplência uma constante nas relações jurídicas.
Diante desta dificuldade de satisfação do crédito pelo credor pelos meios típicos ou de direito – como o bloqueio de valores em conta e a penhora de outros bens –, as discussões e aplicações das medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias têm se tornado cada vez mais recorrentes.
O Código de Processo Civil possibilitou a utilização dos chamados meios atípicos de execução e de medidas de coerção indireta e psicológica para obrigar o devedor a cumprir determinada obrigação, como, por exemplo, a apreensão de documentos, passaportes, bloqueios de cartões de crédito, entre outras. A aplicação destas medidas atípicas, por óbvio, devem observar os fins sociais e o bem comum, resguardando a dignidade humana tanto dos devedores quanto dos credores.
Neste sentido, em recente e inovadora decisão, o relator de um processo que tramita na 8ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT), ao julgar pedido de atribuição de efetivo suspensivo, decidiu que fossem penhoradas 62.929 milhas aéreas que um devedor possuía junto ao programa de milhagem de uma companhia aérea.
A ação de cobrança supracitada, foi movida em face de uma empresa de criptomoedas e seu sócio, acusados de pirâmide financeira. Frustradas as buscas patrimoniais e financeiras nos sistemas judiciais que pudessem satisfazer o crédito, o Autor requereu a penhora dos pontos em programas de milhagens da companhia aérea, sendo o pedido deferido pelo juízo, que entendeu que “a referida pontuação tem valor econômico, tanto que é comercializada em diversos sítios eletrônicos, tais como: Maxmilhas, Hotmilhas, 123milhas, entre inúmeros outros e que “todos os bens do devedor devem responder por suas dívidas”.
Outra importante decisão, sobreveio recentemente do Superior Tribunal Federal (STF), que por maioria, declarou a constitucionalidade da apreensão de passaporte, Carteira Nacional de Habilitação, assim como a proibição de participar de concursos públicos e licitações, como forma de garantir o pagamento de dívidas pelo devedor.
Com efeito, a turma rejeitou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5941, apresentada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que questionava a validade do Artigo 139, VI, do Código de Processo Civil. Em suma, o partido alegava que o cumprimento de decisões judiciais não deve sobrepor aos direitos fundamentais do cidadão, como por exemplo, o direito de locomoção.
O relator do caso, argumentou que é inviável proibir magistrados de aplicarem as medidas coercitivas com fito de garantir a execução, vez que o próprio Código de Processo Civil estabelece que as decisões judiciais devem ser eficazes, e, portanto, valer-se dessas restrições contribuem de sobremodo a finalidade da Execução.
A decisão enalteceu ainda, que os magistrados devem considerar os princípios da menor onerosidade e da proporcionalidade na aplicação, de forma que a restrição seja menos gravosa ao Devedor, além disso, a decisão deverá observar o contraditório e ser fundamentada, demonstrando a necessidade e utilidade da medida, sob pena de ser considerada arbitrária.
Diante dos novos entendimentos, é possível verificar que a finalidade de adoção dessas medidas executivas indiretas, que agem sobre a pessoa do devedor, é uma forma de pressiona-lo psicologicamente para que se convença de que o melhor a fazer é cumprir voluntariamente a obrigação, evitando tais medidas forçosas.
Portanto, os meios atípicos de constrição patrimonial, vêm ganhando força e figurando reiteradas decisões inovadoras, possibilitando ao credor receber aquilo que lhe é devido (e que provavelmente não receberia por meio das medidas típicas de execução). Certamente, com o passar do tempo, outras medidas judiciais atípicas e criativas surgirão e as possibilidades de êxito nas execuções serão ampliadas, aumentando a credibilidade do Poder Judiciário e reduzindo o elevado grau de inadimplência no país.